MISSA DO DIA
11 de Abril de 2004
RITOS INICIAIS
Cântico de entrada: O Senhor ressuscitou verdadeiramente, A. Cartageno, NRMS 65
Salmo 138, 18.5-6
Antífona de entrada: Ressuscitei e estou convosco para sempre; pusestes sobre mim a vossa mão: é admirável a vossa sabedoria.
Ou:
Lc 24, 34; cf. Ap 1, 5
O Senhor ressuscitou verdadeiramente. Aleluia. Glória e louvor a Cristo para sempre. Aleluia.
Diz-se o Glória.
Introdução ao espírito da Celebração
Cristo ressuscitou. Nós somos também chamados a ressuscitar para uma vida nova.
A vitória da vida manifesta-se em nós através das obras.
Para podermos celebrar dignamente esta vida nova e para que ela seja mais viva, recordemos os aspectos da nossa existência onde queremos projectar a luz da ressurreição do Senhor.
Oração colecta: Senhor Deus do universo, que neste dia, pelo vosso Filho Unigénito, vencedor da morte, nos abristes as portas da eternidade, concedei-nos que, celebrando a solenidade da ressurreição de Cristo, renovados pelo vosso Espírito, ressuscitemos para a luz da vida. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
Liturgia da Palavra
Primeira Leitura
Monição: A primeira leitura da liturgia deste domingo de Páscoa é tirada de um dos discursos de Pedro. Falando a um grupo de pagãos, Pedro resume em quatro pontos a mensagem cristã: primeiro, Jesus passou fazendo o bem e curando; segundo, o que os judeus lhe fizeram; terceiro, como Jesus reagiu perante a maldade humana; por último, fala da missão dos discípulos.
Actos dos Apóstolos 10, 34a.37-43
Naqueles dias, 34aPedro tomou a palavra e disse: 37«Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia, depois do baptismo que João pregou: 38Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando a todos os que eram oprimidos pelo Demónio, porque Deus estava com Ele. 39Nós somos testemunhas de tudo o que Ele fez no país dos judeus e em Jerusalém; e eles mataram-n’O, suspendendo-O na cruz. 40Deus ressuscitou-O ao terceiro dia e permitiu-Lhe manifestar-Se, 41não a todo o povo, mas às testemunhas de antemão designadas por Deus, a nós que comemos e bebemos com Ele, depois de ter ressuscitado dos mortos. 42Jesus mandou-nos pregar ao povo e testemunhar que Ele foi constituído por Deus juiz dos vivos e dos mortos. 43É d’Ele que todos os profetas dão o seguinte testemunho: quem acredita n’Ele recebe pelo seu nome a remissão dos pecados».
O texto faz parte do corpo do discurso de Pedro em Cesareia na casa do centurião Cornélio, o qual tinha mandado chamar Pedro a Jope, ilustrado por uma visão (cf. Act 10, 1-33). Este discurso tem um carácter mais catequético e apologético do que propriamente missionário, como seria de esperar num primeiro anúncio da fé a um pagão (embora se tratasse dum «temente a Deus»: v. 2). Lucas redige este discurso a pensar mais nos leitores da sua obra, do que com a preocupação de reconstruir exactamente a cena originária e as mesmas palavras pronunciadas naquela circunstância; com efeito, começa por fazer referência ao Evangelho já antes pregado aos ouvintes: «vós sabeis o que aconteceu…», e também parece que dá por suposta a fé no valor salvífico da Cruz (cf. v. 39b) e não termina, como seria de esperar, com um apelo explícito à conversão. Lucas deixou-nos mais uma bela síntese do que era o Evangelho pregado pela Igreja primitiva.
38 «Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus». Esta nova tradução litúrgica desfez a hendíadis tão própria da estilística hebraica (ungiu de Espírito Santo e de fortaleza), recorrendo, por motivo de clareza, a uma equivalência dinâmica, (a força que é o Espírito Santo). Deus (o Pai) concedeu à natureza humana de Jesus todos os dons do Espírito Santo, que Lhe competiam a partir do momento da Incarnação; estes dons manifestam-se visivelmente nos milagres de Jesus, nas teofanias do Baptismo e da Transfiguração e muito particularmente na Ressurreição. A unção era o rito que constituía os reis e os sacerdotes na sua função: a união hipostática aparece como a unção da natureza humana de Jesus, «que passou fazendo o bem e curando a todos» (maravilhoso resumo da vida de Jesus, bem ao sabor do Evangelista da bondade).
41 «Não a todo o povo»: Jesus não se mostra a todos depois de ressuscitado, não só para não violentar a liberdade das pessoas, mas também porque está nos planos divinos conduzir o mundo à salvação mediante o ministério dos seus discípulos (testemunhas de antemão designadas por Deus) e mediante a fé, que é meritória (cf. Rom 1, 16-17). Note-se o acento que se põe no testemunho acerca da Ressurreição: não estamos apenas perante uns simples pregadores (cf. v. 42a) de uma mensagem salvadora, mas diante de verdadeiras testemunhas (cf. v. 42b) que dão testemunho (o verbo grego tem um matiz forense) capaz de fazer fé em tribunal; a ideia de testemunho é fortemente acentuada neste breve texto, não só por ser repetida quatro vezes (vv. 39.41.42.43), mas por se tratar de testemunhas escolhidas por Deus para esta missão (v. 41), que conviveram com o Ressuscitado, comendo e bebendo com Ele, o que exclui logo à partida a hipótese de se tratar de mera fantasia (Lucas mostra especial sensibilidade a este problema: cf. Lc 24, 37-43).
Salmo Responsorial Sl 117 (118), 1-2.16ab-17.22-23 (R. 24)
Monição: Como agradecimento pelos prodígios realizados pelo Senhor, vamos recitar o Salmo responsorial, exaltando e cantando de alegria, como rezamos no seu refrão.
Refrão: Este é o dia que o Senhor fez: exultemos e cantemos de alegria.
Ou: Aleluia.
Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom,
porque é eterna a sua misericórdia.
Diga a casa de Israel:
é eterna a sua misericórdia.
A mão do Senhor fez prodígios,
a mão do Senhor foi magnífica.
Não morrerei, mas hei-de viver
para anunciar as obras do Senhor.
A pedra que os construtores rejeitaram
tornou-se pedra angular.
Tudo isto veio do Senhor:
é admirável aos nossos olhos.
Segunda Leitura
(Missa da manhã)
Monição: S. Paulo, nesta leitura, incita-nos a procurarmos as coisas do alto, a fim de descobrirmos a vida nova revelada em Jesus Cristo. Dela já participamos através do Baptismo que recebemos. Saibamos, por tal motivo, discernir e filtrar tudo o que não conduz à realização plena da nossa humanidade.
Colossenses 3, 1-4
Irmãos: 1Se ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus. 2Afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra. 3Porque vós morrestes e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. 4Quando Cristo, que é a vossa vida, Se manifestar, também vós vos haveis de manifestar com Ele na glória.
1 «Aspirai às coisas do alto» corresponde ao mesmo incitamento que, na Santa Missa, a Igreja sempre nos repete: (Sursum corda! Corações ao alto!).
3-4 «Vós morrestes». Cf. Rom 6: a nossa união a Cristo pressupõe a morte para o pecado, que não pode reinar mais em nós. Com Cristo morto pelos nossos pecados, morremos para o pecado; com Cristo ressuscitado, vivamos vida de ressuscitados. É a «vida» da graça, uma vida toda interior, «escondida» no centro da alma, vida que ninguém pode arrebatar, vida que é toda feita de presença de Deus e de visão sobrenatural, levando-nos a santificar todos os afazeres diários, trabalhando com os pés bem firmes na terra, mas o coração e o olhar fixo no Céu.
1 Cor 5, 6b-8 (de tarde, facultativa)
Monição: A imagem do fermento, utilizada por S. Paulo, é tomada no sentido de que a comunidade cristã viva no mundo sem, todavia, estar com ele comprometido. A vida só tem a sua plena realização no mundo de Deus.
1 Coríntios 5, 6b-8
Irmãos: 6bNão sabeis que um pouco de fermento leveda toda a massa? 7Purificai-vos do velho fermento, para serdes uma nova massa, visto que sois pães ázimos. Cristo, o nosso cordeiro pascal, foi imolado. 8Celebremos a festa, não com fermento velho nem com fermento de malícia, mas com os pães ázimos da pureza e da verdade.
Parece haver aqui (v. 6b) uma referência ao incestuoso de que acaba de falar (vv. 1-5): um mau exemplo é um mau fermento. Mas S. Paulo faz imediatamente uma aplicação mais vasta da ideia de mau fermento, e isto talvez pela proximidade da festa da Páscoa, que já então, pelo ano 55, os cristãos celebravam em Corinto como festa da Ressurreição do Senhor, segundo o que se lê no v. 8: «celebremos pois a festa». Na exortação do Apóstolo há uma alusão ao costume judeu, que ainda hoje se conserva, de limpar escrupulosamente as casas de todo o fermento e pão fermentado durante os sete dias que duravam as festas pascais. Nós os cristãos, para celebrarmos a Páscoa – «Cristo, nosso Cordeiro pascal» (v. 7) –, temos que o fazer sem o fermento (o princípio corruptor) da malícia e da perversidade, mas «com os pães ázimos da pureza e da verdade, isto é, da sinceridade de vida. Poderia haver, nesta referência a Cristo como «cordeiro imolado», uma alusão à própria celebração da Eucaristia.
Sequência
À Vítima pascal
ofereçam os cristãos
sacrifícios de louvor.
O Cordeiro resgatou as ovelhas:
Cristo, o Inocente,
reconciliou com o Pai os pecadores.
A morte e a vida
travaram um admirável combate:
Depois de morto,
vive e reina o Autor da vida.
Diz-nos, Maria:
Que viste no caminho?
Vi o sepulcro de Cristo vivo
e a glória do Ressuscitado.
Vi as testemunhas dos Anjos,
vi o sudário e a mortalha.
Ressuscitou Cristo, minha esperança:
precederá os seus discípulos na Galileia.
Sabemos e acreditamos:
Cristo ressuscitou dos mortos:
Ó Rei vitorioso,
tende piedade de nós.
Aclamação ao Evangelho 1 Cor 5, 7b-8a
Jo 20, 1-9 (de manhã)
Monição: Diante dos sinais da morte podem reconhecer-se os sinais de vida. Várias são as atitudes que podemos tomar, mas o testemunho deve ser passado, segundo as circunstâncias peculiares de cada um, como o fizeram Pedro, João e Madalena. Por caminhos diferentes viram e acreditaram.
Lc 24, 13-35 (de tarde)
Monição: S. Lucas salienta os «lugares» da presença de Jesus ressuscitado: Ele continua a caminhar entre os homens, solidarizando-Se com os seus problemas e participando nas suas lutas; está presente nas Escrituras, que mostram o sentido da Sua vida e acção; e está presente na celebração eucarística, onde o pão repartido recorda o dom da Sua vida e alimenta a partilha e a fraternidade, que estão no centro do projecto de Deus.
Aleluia
Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado:
celebremos a festa do Senhor.
Cântico: Aclamação – 4, F. da Silva, NRMS 50-51
São João 20, 1-9 (de manhã)
1No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi de manhãzinha, ainda escuro, ao sepulcro e viu a pedra retirada do sepulcro. 2Correu então e foi ter com Simão Pedro e com o discípulo predilecto de Jesus e disse-lhes: «Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram». 3Pedro partiu com o outro discípulo e foram ambos ao sepulcro. 4Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo antecipou-se, correndo mais depressa do que Pedro, e chegou primeiro ao sepulcro. 5Debruçando-se, viu as ligaduras no chão, mas não entrou. 6Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguira. Entrou no sepulcro e viu as ligaduras no chão 7e o sudário que tinha estado sobre a cabeça de Jesus, não com as ligaduras, mas enrolado à parte. 8Entrou também o outro discípulo que chegara primeiro ao sepulcro: viu e acreditou. 9Na verdade, ainda não tinham entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos.
2 «Não sabemos…»: este plural parece aludir à tradição sinóptica que conhece a ida de mais mulheres ao sepulcro. É evidente que não houve a mínima preocupação de harmonizar os diferentes relatos evangélicos do sepulcro vazio e das aparições, o que é um forte motivo de credibilidade a favor da realidade da ressurreição, facto misterioso, que é a base de toda a fé cristã (cf. 1 Cor 15, 12-19).
7-8 «Viu e acreditou». Porque começou a crer o discípulo? A explicação habitual é que um ladrão não deixaria ficar os panos, e muito menos em ordem. Mas há mais dados a ter em conta: porque é que o Evangelista atribui tanta importância à diferente posição dos panos? É que as ligaduras e o lençol estavam espalmados no chão da pedra tumular, ao passo que o pano que envolvera a cabeça do Senhor não estava espalmado no chão, mas mantinha a forma da cabeça que envolvera (cf. a nossa tradução na Nova Bíblia da Difusora Bíblica). Não sabemos se Pedro partilhou da fé do Discípulo Amado, mas S. Lucas diz que ficou maravilhado (cf. Lc 24,12). Os panos com que Jesus foi amortalhado eram com toda a probabilidade: 1) um lençol mortuário (síndone), tecido largo e comprido que envolvia todo o corpo; 2) um lenço (sudário) que cobria a cabeça e caia sobre o rosto; 3) várias ligaduras que não só serviam para manter apertados os pés um contra o outro e as mãos unidas ao corpo, mas também que poderiam ajudar a aconchegar a síndone ao corpo. S. João não fala especificamente desta síndone, mas deve englobá-lo na designação genérica de «ligaduras»(em grego, othónia).
9 «Ainda não tinham entendido a Escritura»: Os discípulos não estavam psicologicamente predispostos a admitir a ressurreição para que esta pudesse ser fruto de uma alucinação; com efeito, só depois de confrontados com a realidade da ressurreição de Jesus é que se recordaram das Escrituras (cf. 1 Cor 15, 4; Act 2, 24-32; Jo 2, 22) e as entenderam. A ressurreição era uma realidade só admissível para o fim do mundo (cf. Jo 11, 24), pois, apesar de Jesus ter anunciado a sua ressurreição ao terceiro dia, este só poderia ser o dia final, de acordo com o a profecia de Oseias (Os 6, 2). Diante do sepulcro vazio, só pensam num roubo (vv. 2.13.15) e não dão crédito a quaisquer notícias das aparições (cf. Mc 6, 11.13; Lc 24, 21-24; Jo 20, 25).
Em vez deste Evangelho, pode ler-se o que se leu na Vigília da Noite Santa.
Nas missas vespertinas pode ler-se o Evangelho de Lc 24, 13-35.
São Lucas 24, 13-35 (de tarde)
13Dois dos discípulos de Jesus iam a caminho duma povoação chamada Emaús, que ficava a duas léguas de Jerusalém. 14Conversavam entre si sobre tudo o que tinha sucedido. 15Enquanto falavam e discutiam, Jesus aproximou-Se deles e pôs-Se com eles a caminho. 16Mas os seus olhos estavam impedidos de O reconhecerem. 17Ele perguntou-lhes: «Que palavras são essas que trocais entre vós pelo caminho?» Pararam, com ar muito triste, 18e um deles, chamado Cléofas, respondeu: «Tu és o único habitante de Jerusalém a ignorar o que lá se passou nestes dias». 19E Ele perguntou: «Que foi?» Responderam-Lhe: «O que se refere a Jesus de Nazaré, profeta poderoso em obras e palavras diante de Deus e de todo o povo; 20e como os príncipes dos sacerdotes e os nossos chefes O entregaram para ser condenado à morte e crucificado. 21Nós esperávamos que fosse Ele quem havia de libertar Israel. Mas, afinal, é já o terceiro dia depois que isto aconteceu. 22É verdade que algumas mulheres do nosso grupo nos sobressaltaram: foram de madrugada ao sepulcro, 23não encontraram o corpo de Jesus e vieram dizer que lhes tinham aparecido uns Anjos a anunciar que Ele estava vivo. 24Alguns dos nossos foram ao sepulcro e encontraram tudo como as mulheres tinham dito. Mas a Ele não O viram». Então Jesus disse-lhes: 25»Homens sem inteligência e lentos de espírito para acreditar em tudo o que os profetas anunciaram! 26Não tinha o Messias de sofrer tudo isso para entrar na sua glória?» 27Depois, começando por Moisés e passando pelos Profetas, explicou-lhes em todas as Escrituras o que Lhe dizia respeito. 28Ao chegarem perto da povoação para onde iam, Jesus fez menção de seguir para diante. 29Mas eles convenceram-n’O a ficar, dizendo: «Ficai connosco, porque o dia está a terminar e vem caindo a noite». Jesus entrou e ficou com eles. 30E quando Se pôs à mesa, tomou o pão, recitou a bênção, partiu-o e entregou-lho. 31Nesse momento abriram-se-lhes os olhos e reconheceram-n’O. Mas Ele desapareceu da sua presença. 32Disseram então um para o outro: «Não ardia cá dentro o nosso coração, quando Ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?» 33Partiram imediatamente de regresso a Jerusalém e encontraram reunidos os Onze e os que estavam com eles, 34que diziam: «Na verdade, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão». 35E eles contaram o que tinha acontecido no caminho e como O tinham reconhecido ao partir o pão.
Temos aqui uma das mais belas páginas do Evangelho: um relato cheio de vivacidade, de finura e de psicologia, em que acompanhamos o erguer daquelas almas desde a mais amarga frustração até às alturas da fé e da descoberta de Jesus ressuscitado. A crítica bíblica procura distinguir neste relato os elementos de tradição e os elementos redaccionais; podem identificar-se muitos elementos de tradição neste relato, mas não dispomos de meios para classificar como meramente redaccionais todos os restantes, pois não são do nosso conhecimento todas as fontes de que Lucas dispôs; a própria crítica admite «fontes especiais» para a redacção de Lucas. Um facto indiscutível é que Lucas é um teólogo e um catequista, não é um jornalista e não se limita a contar a seco umas aparições, mas não temos elementos suficientes para definir em que medida reelaborou as suas fontes.
13 «Emaús»: uma povoação a 60 estádios (duas léguas), uns 11 quilómetros e meio de Jerusalém. Há duas leituras variantes nos manuscritos gregos do Evangelho de Lucas: a imensa maioria deles regista 60 estádios. Alguns poucos têm 160 (o que equivale a uns 30 Km). Também não existe completo acordo sobre a sua localização, sendo indicados vários locais na tradição cristã; El-Qubeibe é o de maior aceitação, a uns 12 Km a Noroeste da Cidade Santa.
16 «Mas os seus olhos estavam impedidos de O reconhecerem». Não é que não vissem a Jesus, ou que Jesus se quisesse ocultar, mas eles é que estavam obcecados pelo seu extremo desalento. E fica-nos a lição: para que se possa reconhecer a Jesus ressuscitado é indispensável o olhar da fé.
18 «Cléofas» parece ser diferente do marido de Maria, mãe de Tiago e José (Jo 19, 25); embora alguns o identifiquem, a grafia é diferente: Kleopâs.
22-24 «É verdade que algumas mulheres… Alguns dos nossos»: aqui se resume o que foi relatado antes com mais pormenor (Lc 23, 56b - 24, 9) e correspondente à tradição sinóptica e joanina. Certamente que os nossos são Pedro e João (cf. v. 12 e Jo 20, 1-10). «Mas a Ele não O viram»: se não se trata de um pormenor meramente redaccional, temos que admitir que ainda não lhes constava da aparição de Jesus a Pedro referida adiante, no v. 34; (cf. 1 Cor 15, 5).
28-30 «Jesus fez menção de seguir para diante». Lucas volta a aludir ao «caminho de Jesus» (no v. 15 já tinha usado o mesmo verbo grego que significa caminhar). R. J. Dillon (From eye-witnesses to ministers of the word) pensa que este pormenor lucano insinua que a presença de Jesus no meio dos seus através da Eucaristia (a fracção do pão do v. 30) constitui o momento cume do seu caminhar pelo caminho da salvação. Enternece o leitor ver como Jesus ressuscitado se torna o companheiro de caminho (recorde-se como Lucas gosta de focar a vida cristã como um caminho e um seguimento de Jesus): depois de se fazer encontrado, agora faz-se rogado. Isto sucede-nos muitas vezes na vida cristã: Ele vem ao nosso encontro sem O procurarmos e, outras vezes, quer dar-nos o ensejo de O convidarmos a ficar connosco e de praticarmos a caridade com os outros, que são Ele (cf. Mt 25, 40). Mas aqui o convite feito a Jesus não é um simples acto de caridade e de cortesia; com efeito, parece que a narrativa nos leva a pensar que quem faz este pedido é toda a comunidade cristã, que se reúne para celebrar a Eucaristia e anseia estabelecer uma comunhão íntima com Jesus ressuscitado (ibid.). Todos estão de acordo em ver a estreita relação da refeição descrita com a multiplicação dos pães e a instituição da Eucaristia.
31 «Abriram-se-lhes os olhos e reconheceram-no, mas Ele desapareceu da sua presença»: É na Eucaristia que se abrem os olhos para a fé, para captar o que é invisível, mas real. Impressiona muito o relato ao unir o aparecimento com o desaparecimento, sem se dizer para onde é que Jesus se retirou. Desta maneira fica sugerida uma nova presença, a de Jesus glorioso e ressuscitado: uma ausência que é presença.
32 «Não ardia cá dentro o nosso coração?». Quando lemos a Escritura guiados por Jesus, presente na Igreja, inflama-se o nosso coração e sentimo-nos urgidos a mostrar aos que nos rodeiam, com as nossas vidas, pela palavra e pelo exemplo, que Cristo vive, que a Ressurreição é uma realidade. O episódio constitui um apelo a fazermos o mesmo papel do Ressuscitado junto dos desiludidos da vida e sem esperança e a comunicar-lhes a nossa experiência de fé. No relato põe-se em evidência a união do pão e da palavra na vida da Igreja.
Sugestões para a homilia
A vitória da vida
Esperança para o mundo
O compromisso do cristão
A vitória da vida
Há regiões e situações neste nosso mundo em que a morte parece dominar de maneira absoluta e o silêncio comemora a sua vitória. O poder, a tirania, o princípio do terror ou da força, a discriminação, a injustiça, a astúcia e a perversidade parecem querer derrotar completamente as forças da vida, para assegurarem o triunfo do mal e da morte.
Assim parecia acontecer também quando Maria Madalena se acercou do sepulcro. Mas Deus manifesta o primeiro sinal da revolução social que a ressurreição de Jesus iria operar. É através desta mulher, discriminada no seu tempo e na sua terra, pela sua condição, tanto quanto os escravos, os pastores e as crianças que não eram consideradas pessoas idóneas, que Deus vai anunciar que a morte fora vencida, que se processara a vitória da vida.
Os dois discípulos que acorreram ao túmulo, depois do anúncio feito por Madalena, manifestam duas atitudes diferentes. Pedro, limita-se a constatar o facto, mas ainda não chega à fé na Ressurreição, o outro discípulo, vendo as mesmas coisas, «começa a acreditar».
Ainda hoje se repete o comportamento destes dois discípulos, diante das situações desta vida. Há quem pense que a doação da própria vida é somente morte, renúncia, destruição de si mesmo. Outros, todavia, compreendem que uma vida consagrada aos irmãos, como fez Jesus, não termina na morte, mas abre-se na perspectiva da plenitude da vida em Deus.
Como nos posicionamos nós diante da escolha do dom da vida? Sabemos apenas interpretar os sinais da morte (como Pedro), ou descobrimos os sinais de vida redentora (como o outro discípulo)?
Esperança para o mundo
Num mundo completamente acabrunhado pelos sinais de morte, teremos de ser testemunhas de esperança de vida. Testemunha é aquele que presencia um facto, viu o que aconteceu e escutou as palavras pronunciadas. Os apóstolos foram testemunhas. Nós também seremos testemunhas se fizemos a experiência da ressurreição.
No baptismo passamos da morte à vida. Se a nossa vida se modificou completamente a partir desse momento, então poderemos considerarmos testemunhas da ressurreição e esperança para este mundo desalentado. Como os discípulos, também nós recebemos o testemunho. Por tal motivo, devemos passá-lo ao mundo.
A fé, neste mundo, é o que distingue os crentes dos ateus. Estes, julgam que se conseguem salvar contando apenas com as suas forças e que a plena felicidade se consegue neste mundo. Mesmo que todos os problemas materiais pudessem ser resolvidos, acabasse a fome, a dor e todas as doenças, algumas perguntas ainda ficariam por responder no mais íntimo do coração do homem: porque vivo e porque morro? De onde venho? Para onde vou?
Somente Cristo morto e ressuscitado dá resposta satisfatória a estas perguntas.
O compromisso do cristão
Os cristãos trabalham, interessam-se e ocupam-se nas coisas deste mundo, tal como todos os outros. Todavia têm a plena convicção de que a plenitude da vida não pode ser alcançada aqui, como nos diz S. Paulo.
Por isso, o seu compromisso testemunhal só poderá ser realizado através das boas obras, que serão manifestação da vida nova e sinais da sua presença. Se nas nossas comunidades conduzirmos a vida como ressuscitados, se abandonarmos as obras de morte – ódios, rancores, invejas, violências, vinganças, guerrilhas, julgamentos apressados, propagação de boatos, humilhações... – então poderemos proclamar-nos testemunhas da ressurreição. Ninguém ousará duvidar do nosso testemunho, pois que estará fundamentado sobre factos que todos poderão verificar. Saibamos, pois, ser o fruto que poderá aparecer e crescer somente numa árvore viva e viçosa.
Oração Universal
Irmãos e irmãs:
Elevemos as nossas preces a Deus Pai,
agradecendo o dom da Ressurreição de Seu Filho Jesus
e supliquemos a renovação da Igreja e a ressurreição de cada um de nós, dizendo:
Nós Vos rogamos, Senhor, ouvi-nos.
1. Pela Santa Igreja de Cristo,
para que saiba testemunhar a Boa Nova de Cristo
através das suas obras.
Oremos, irmãos.
2. Por todos os que foram baptizados,
Para que sintam a alegria da generosa fidelidade
ao anúncio da Ressurreição.
Oremos, irmãos.
3. Por todos os consagrados,
para que sejam fermento de transformação do mundo
através da lealdade aos valores evangélicos.
Oremos, irmãos.
4. Para que todos os homens
se sintam irmanados na Ressurreição de Cristo,
promovam a paz e vivam como irmãos da única família cristã.
Oremos, irmãos.
5. Para que Jesus ressuscitado
nos torne presente o mistério de amor da Trindade,
na certeza de que caminhamos para a felicidade sem fim,
como filhos de um único Pai.
Oremos, irmãos.
Senhor, nosso Deus e nosso Pai,
que libertastes vosso Filho do poder da morte,
e n’Ele garantistes a nossa libertação,
concedei-nos a coragem de renunciarmos à fragilidade do pecado,
para, com Cristo, ressuscitarmos para a vida que não acaba.
Pelo mesmo nosso Senhor Jesus Cristo, que é Deus convosco,
na unidade do Espírito Santo.
Liturgia Eucarística
Cântico do ofertório: Bendita e louvada seja, M. Simões, NRMS 41
Oração sobre as oblatas: Exultando de alegria pascal, nós Vos oferecemos, Senhor, este sacrifício, no qual tão admiravelmente renasce e se alimenta a vossa Igreja. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
Prefácio pascal I [mas com maior solenidade neste dia]: p. 469 [602-714]
No Cânone Romano dizem-se o Communicantes (Em comunhão com toda a Igreja) e o Hanc igitur (Aceitai benignamente, Senhor) próprios.
Nas Orações Eucarísticas II e III fazem-se também as comemorações próprias.
Santo: J. Santos, NRMS 6 (II)
Saudação da paz
Como prova de que através do nosso baptismo nada ficou em nós da nossa vida antiga e que a partir de agora nos vamos conduzir como verdadeiros ressuscitados, procurando testemunhar sinais de vida nova e de esperança, saudemo-nos fraternalmente na paz de Cristo.
Cântico da Comunhão: O hino da alegria, M. Faria, NRMS 21
1 Cor 5, 7-8
Antífona da comunhão: Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado: celebremos a festa com o pão ázimo da pureza e da verdade. Aleluia.
Cântico de acção de graças: Louvai o Senhor, com tudo, M. Simões, NRMS 2 (I)
Oração depois da comunhão: Senhor nosso Deus, protegei sempre com paternal bondade a vossa Igreja, para que, renovada pelos mistérios pascais, mereça chegar à glória da ressurreição. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
Ritos Finais
Monição final
A Ressurreição responde a ideologias e sistemas que a experiência e a história se têm encarregado de desmentir dando sentido à nossa esperança. Como irmãos da única família humana, partamos para a vida, procurando viver na certeza da Ressurreição de Jesus Cristo como fonte de vida nova, esperança do futuro e resposta a todas as interrogações dos homens.
Cântico final: Vencida foi a morte, J. S. Bach, NRMS 57
Na despedida, durante toda a Oitava, diz-se:
V. Ide em paz e o Senhor vos acompanhe. Aleluia. Aleluia.
R. Graças a Deus. Aleluia. Aleluia.
Homilias Feriais
TEMPO PASCAL
OITAVA
2ª feira, 12-IV: Cristo: O tesouro e a alegria.
Act 2, 14. 22-32 / Mt 28, 8-15.
Maria de Magdala e a outra Maria, que tinham ido ao túmulo do Senhor, retiraram-se dele a toda a pressa, cheias de medo e de grande alegria.
A Ressurreição de Cristo é causa de grande alegria. As santas mulheres que o viram (cf. Ev.), sabem que Ele vive e falaram com Ele.«Agora é para Cristo ressuscitado que a Igreja olha. Passados dois mil anos destes acontecimentos, a Igreja revive-os como se tivessem sucedido hoje. No rosto de Cristo, Ela – a Esposa – contempla o seu tesouro, a sua alegria. Como é doce a recordação de Jesus, fonte de verdadeira alegria do coração» (NMI, 28).
Fomentemos sempre a alegria e, se algumas vezes nos falta, vamos logo procurar o Senhor. E, como as santas mulheres, comuniquemos esta alegria a todos os que nos rodeiam.
3ª feira, 13-IV: Encontro com Cristo e conversão.
Act 2, 36.41 / Jo 20,11-18
Disse-lhe Jesus: Mulher, por que estás a chorar? A quem procuras?
Maria Madalena manifesta a sua grande dor, por ver que o corpo de Jesus tinha desaparecido do túmulo (cf. Ev.).Depois de reencontrar Jesus é enorme a sua alegria, a esperança substitui o desânimo. É preciso começar de novo.
«Deus é quem nos dá coragem de começar de novo. É ao descobrir a grandeza do amor de Deus que o nosso coração é abalado pelo horror e pelo peso do pecado... O coração humano converte-se, ao olhar para aquele a quem os nossos pecados trespassaram» (CIC, 1432). É o que S. Pedro recorda aos judeus, lembrando-lhes a crucifixão de Cristo, e pedindo-lhe a conversão (cf.Leit.).
4ª feira, 14-IV: A Escritura: alimento e força.
Act 3, 1-10 / Lc 24, 13-35
Não nos ardia cá dentro o coração, quando Ele nos falava pelo caminho e nos desvendava as Escrituras?
O encontro dos discípulos de Emaús com Cristo ressuscitado provoca neles uma enorme transformação: do desânimo ao amor ardente (cf. Ev.). Esta transformação tem como fundamento a explicação das Escrituras feitas pelo próprio Jesus.
Para a recristianização da Europa o Papa aconselha a leitura do Evangelho:«Igreja na Europa, entra no novo milénio com o livro do Evangelho! Que a Bíblia Sagrada continue a ser um tesouro para a Igreja e para cada cristão: no estudo cuidadoso da Palavra, encontraremos alimento e força para realizar quotidianamente a nossa missão» (INE, 65).Dediquemos diariamente alguns momentos à sua leitura.
5ª feira, 15-IV: Empenho na construção da paz.
Act 3, 11-26 / Lc 24, 35-48
(Jesus): A paz esteja convosco... Por que estais perturbados e por que se levantam dúvidas no íntimo dos vossos corações?
A paz é um dos grandes dons do Ressuscitado. «A paz terrena é imagem e fruto da paz de Cristo, o ‘Príncipe da paz’ messiânico...'Ele é a nossa paz' e declara ‘bem aventurados os obreiros da paz’» (CIC, 112).
Os conflitos que afligiram a Europa, no último século, mostraram como é frágil a paz (cf. INE, 112). E, por isso, a Europa, com todos os seus habitantes deve empenhar-se incansavelmente na construção da paz dentro das suas fronteiras e no mundo inteiro» (INE, 112). Cada um de nós pessoalmente deve esforçar-se por difundir a paz a sua volta, começando por nós próprios: «A formação da consciência garante a liberdade e gera a paz do coração»(CIC, 1784).
6ª feira, 16-IV: Evangelização da cultura.
Act 4, 1-12 / Jo 21, 1-14
Lançai a rede para a direita do barco e haveis de encontrar.
Foi fecunda esta pesca milagrosa, graças à fé nas palavras do Senhor (cf. Ev.).Também foi muito fecunda a influência do cristianismo na Europa: «Recordando a fecundidade cultural do Cristianismo ao longo da história na Europa, também hoje é preciso mostrar a perspectiva evangélica, teórica e prática, da realidade humana e do homem» (INE, 58).
Com fé continua a ser válido o anúncio de Cristo, de modo «a plasmar uma mentalidade cristã na vida corrente: na família, na escola, na comunicação social, no mundo da cultura, do trabalho e da economia, na política, nos tempos livres, na saúde e na doença» (INE, 58).Vamos todos pôr mãos à obra nesta tarefa.
Sábado, 17-IV: O rosto espiritual da Europa.
Act 4, 13-21 / Mc 16, 9-15
Depois disse-lhes: Ide a todo o mundo e proclamai a Boa Nova a toda as criaturas.
Cristo continua a pedir que levemos a cabo o anúncio do seu Evangelho.
Na Europa foi-se realizando esta missão ao longo de vários séculos: «de tal modo que o rosto espiritual da Europa se foi formando graças aos esforços de grandes missionários, ao testemunho de santos e mártires e ao trabalho incansável de monges, religiosos e pastores» (INE, 25).
É preciso que este património não se perca: «Consciente disso, a Igreja actualmente sente, com renovada responsabilidade, a urgência de não dissipar este património, mas ajudar a Europa a construir-se a si mesma revitalizando as raízes cristãs que lhe deram origem» (INE, 25).
Celebração e Homilia: António Elísio Portela
Comentários Bíblicos: Geraldo Morujão
Homilias Feriais: Nuno Romão
Sugestão Musical: Duarte Nuno Rocha